Ao contrário do que muitos imaginam no Brasil a respeito
de gospel music, além deste ser o pai da black music, é
também um pilar de sustentação da fé
e do culto dos afro-americanos evangélicos a Deus. Aliás,
grandes nomes como James Brown, Aretha Franklin, Ray Charles, Whitney
Houston, Mary J. Blige, entre outros ases da música negra,
tiveram seu aprendizado nos cultos dominicais das igrejas protestantes
negras... Mas como o gospel chegou aqui? Como toda importação
cultural vinda dos EUA, entre as quinquilharias sonoras sempre aparece
algo interessante: assim foi o gospel music. Todavia, durante a
década de 90, com o crescimento do mercado musical evangélico
nacional, o termo ‘gospel’, se tornou sinônimo
do “ritmo pop”, que nada tem a ver com sua real origem...
E como o autêntico não fica encoberto eternamente,
em 1997, surge uma movimentação no templo da Igreja
Pedra Viva (zona sul paulistana) – onde diga-se de passagem
seja talvez a única “igreja cristã brasileira”
a celebrar cultos de adoração aos moldes dos afro-americanos
– através de um jovem músico que decide dar
asas ao seu projeto de louvor: nasce então Robson Nascimento
e seu coral Just Singers, hoje na formação de 35 pessoas,
dentre estes 4 naipes de vozes, isto sem falar dos músicos...
Músico instrumentista, cantor, arranjador, compositor e maestro,
Robson, particularmente mantém seu currículo endossado
ao lado de artistas importantes como Chitãozinho & Xororó,
Daúde, Wanessa Camargo, Simoninha, MV Bill e Fábio
Júnior, onde atuou como back vocal sem afetar o projeto Just
Singers, que, mesmo que ao seu contragosto, tem sido comparado ao
trabalho do maestro americano Kirk Franklin...
O Portal Campo Grande aproveitou sua visita ao Rio, na tarde de
autógrafos do CD “Tome a Decisão”, na
livraria Godspell (centro), no último dia 28 de outubro
do ano passado, para colher com exclusividade os depoimentos de
um artista preocupado em difundir a Palavra de Deus através
da black music...
TR.
Portal
Campo Grande- Como foi este seu primeiro contato com o plano de
Deus?
Robson Nascimento- Minha mãe é
de berço evangélico, ela veio do interior pra ganhar
a vida em São Paulo, e obviamente, ela sem orientação,
mas sempre tendo o Espirito Santo de Deus protegendo, se desviou,
casou com meu pai, andou um bom tempo longe dos caminhos do Senhor.
E, desde pequeninihos a gente ficava bem longe e ela sempre tentando,
mesmo que por uma questão de consciência, mandar
os filhos pra igreja, mas ela não ia. E nessa fase da adolescência,
eu me afastei dos caminhos, até que ela voltou pra Jesus
– foi quando ela perdeu tudo. A gente também meio
que voltou atrás, só que filho de crente não
é crentinho... a salvação, ela é individual...!
Até que um dia Deus me chamou, e eu, em 91, me converti
de verdade! Já tinha um contato com igreja antes, mas não
era um compromisso sério e a partir daí, Deus começou
a fazer a obra em minha vida!
PCG-
Você trabalhou ao lado de artistas renomados como Simoninha,
Fábio Júnior, Daúde... Por estar com estes,
houve alguma reprovação por parte da Igreja?
RN- Trabalhar com eles foi maravilhoso! Primeiro
porque são pessoas maravilhosas, inclusive quero mandar
um abraço pra todos eles, porque foram pessoas que acreditaram
no meu trabalho e pagaram por ele... É lógico que
isso trouxe uma certa resistência por parte do pessoal das
igrejas, porque existe muito preconceito, um preconceito insistente
e eu posso dizer que isso é por falta de preparo, pelo
medo de não ser um desbravador da fé! Mas nós
temos que estar aonde existem trevas! As trevas são vão
ser trevas se houve a luz e vice-versa! Então precisa haver
esse contato sim, precisa ter gente lá no meio sim trabalhando...
porém, não pode se corromper! E aí, eles
(a igreja) não entendiam muito isso, simplesmente era mais
confortável se eu não estivesse envolvido. Eu corria
menos risco, ou a comunidade evangélica corria menos risco...
Mas tudo isso me trouxe experiência, não só
cristã mas pessoal, um novo relacionamento social, uma
visão melhor das coisas, e eu creio que também foi
o tempo de Deus! Hoje eu não estou mais com eles. Trabalho
somente pra Deus, mas Ele me permitiu estar lá pra angariar
algumas experiências pra poder aplicar aonde estou, e divulgar
também o nome dEle!
PCG-
Se fosse para você atuar no meio secular (não evangélico)
novamente, teria alguma objeção da sua parte?
RN- Sem problemas, mas na realidade, o meu objetivo
é: fazer um trabalho que seja reconhecido e incorporado
no meio secular, porque, quando a gente fala que “nós
não somos do mundo”, existe uma contradição
no meu modo de ver... Nós estamos no mundo! A gente não
tem é que se conformar com ele e vencê-lo! Como?
Trabalhando aquilo que Jesus disse pra gente fazer... e eu crio
que posso fazer isso no secular. Existe toda uma estratégia
de dar uma disfarçada nas mensagens, pra ela poder atingir
o meio secular. Acredito que essa mentalidade é muito boa,
e decidi falar de Jesus mesmo, falar que o sangue dEle tem poder,
que Ele salva – na verdade eu tô tocando a verdade
dEle mais povão, mas falando que Ele é o Cara, que
tem amor pra dar pra gente, vida eterna... eu não tô
falando a linguagem da igreja, porque só ela vai entender,
e você sabe como é o povo: ele gosta de letra e arranjo
fácil! Então, eu estou sendo direto!
PCG-
Porquê a escolha black music no seu trabalho?
RN- Eu ouço black music desde os 6 anos
de idade, aquelas coisas da Chic Show (equipe de som São
Paulo, similar a Furacão 2000, pioneira dos bailes blacks
do estado), e quando eu tinha uns 9, 10 anos – eu não
ia à igreja e se eu fosse também, eu fazer mesmo
assim – ia pros bailinhos dançar ao som de Gap Band,
Kool & The Gang, Marvin Gaye, George Benson, Aretha Framklin,
Barry White, Beth White... Então, eu não tive escolha:
a minha mãe, como ela era professora de piano clássico,
queria que eu escutasse Beethoven, Mozart, Bach... um monte de
gente erudita, mas eu queria black! Porquê não MPB
pelo menos?! Eu me identificava muito com a black, então
a forma de expressar a minha música, foi através
da mesma que eu me alimentei a vida toda. Soul music pura! Tá
no meu DNA!
PCG-
Porquê fazer um “black choir”, se a própria
Igreja era fechada a algumas inovações musicais?
RN- Em 91, logo quando eu havia me convertido,
eu tava na casa de um amigo da extinta Banda Rara, e ele me mostrou
um VHS do Mississipi Mass Choir, comandado pelo Rev. James Moore
– um cara que não tinha nem dentes. Eu me lembro
que eu tava na sala desse amigo, e comecei a ouvir aquilo e a
chorar muito, e eu falei: meu Deus, é isso que eu quero
um dia fazer na minha vida! Aí passou, e esqueci... Em
meados de 97, voltou a idéia de se montar um coral, era
meio que didática, e como eu dava aula de canto, resolvi
montar um coral pros meus alunos. Eu falei isso na segunda-feira,
e quando foi na quarta, eu já queria desistir porque ia
ser um trampo (trabalho árduo), só que nessa quarta,
quando eu liguei pra eles pra dizer que não ia mais fazer,
eles disseram: agora se vira, porque a gente já falou pra
todo mundo que o trabalho ia acontecer... Eu fui na sexta contrariadíssimo,
mas eu mal sabia o que Deus tinha planejado pra mim. A partir
do momento que comecei a trabalhar com eles, tudo começou
a criar forma e Deus a cumprir a promessa dEle e também
pra vontade do meu coração, que era montar um coral
black! E foi assim que pintou do Just Singers...!
PCG-
Houveram influências para formatar o Just Singers?
RN- James Moore! Neguinho fala: ah, é
igual o Kirk Franklin! Eu gosto demais do Kirk Franklin, mas eu
não tenho nenhuma influência dele. Dizem que eu fico
imitando ele, na verdade eu nem conhecia ele! É coisa de
negão, tá no sangue! O Hebert Mota, o cara que trouxe
o Kirk Franklin pro Brasil é testemunha, ele me conhece
muito antes dessa onda de Kirk Franklin e sabe que isso não
tem nada a ver apesar das pessoas falarem que eu me espelho nele...
Na verdade a minha única fonte de inspiração
musical é o Rev. James Moore e eu quero ser igual a ele
quando crescer, risos.
PCG-
O meio evangélico tem sido mais receptivo ao Just Singers
hoje?
RN- Tem! Desde o nosso começo, a idéia
de um coral com uma pegada mais black, sempre foi bem aceita.
Na verdade faltava era um pouco de abertura de mente... mas a
aceitação, ela foi muito legal porque o tipo de
música que a gente faz, graças à Deus –
não por causa de mim, mas porque Ele é maravilhoso!
– é uma música muito acessível a mente
das pessoas, é apenas uma questão de acesso, e muitas
delas ainda não tinham isso facilmente. Hoje têm
mais, devido aos trabalhos das revistas especializadas, das lojas,
rádios, dos sites, você, risos.
PCG-
Embora seja algo ainda novo para os evangélicos cariocas,
porquê a sua vontade de investir com o original gospel no
Rio?
RN- Eu vejo o Rio como um seleiro pra gente poder
armazenar, mas pra também poder distribuir o soul, o r&b,
o hip-hop, porque o pessoal daqui, ele tem essa ginga por natureza,
não só por causa da elegria do carioca, mas por
sua realidade – a quantidade de negros que têm aqui,
é superior a dos outros estados só perdendo talvez
pra Bahia. E isso eu digo até por uma questão de
Brasil: não existe uma raça preestabelecida tipo
“branco ou negro”. O Brasil é negro! O cara
pode ser branquinho, mas ele vive num país negro de influências
negras, e o Rio é o núcleo disso! Então,
se a gente fizer um trabalho legal aqui, meu Deus...! Isso vai
alimentar não só o Brasil, mas o mundo inteiro!
A minha intenção é usar o Rio como uma grande
ferramenta na mão de Deus através da vida da gente
pra que as pessoas não só ouçam a black music,
mas a Palavra de Deus através da black music.
PCG-
Um conselho para quem está ingressando nesta área
ainda guetificada...
RN- Primeiro, eu agradeço a Deus por tá
sendo um instrumento de encorajamento dessa galera, porque, de
repente eles olham o trabalho do Just Singers, do Raiz Coral,
do Luo e dizem: dá pra fazer! Outra coisa muito importante:
preguem a união entre os grupos! Uma das maiores dificuldades
de todos os seguimentos evangélicos, é a união
das rádios, a união das igrejas, a união
dos grupos musicais diversificados – o raggae que não
se une com o rock, que não se une com o funk, que não
se une com o hip-hop... e isso dentro da igreja – então,
parece que o povo que era pra ser unido, não permanece
unido. A gente tem que pregar o contrário e não
prega! É lógico que existem estilos e suas diferenças,
mas eu tô dizendo numa questão do Corpo de Cristo!
Temos que nos unir! Porque esse separatismo, ele acaba que influenciando
a não propagação do evangelho. Se você
é black, e você chega num lugar aonde só tem
rock-and-roll, aprecie o r&r! Vai ser um caminho de duas mãos!
Por exemplo: existe uma relação muito forte entre
mim e o pessoal do Oficina G3! É parceria! União!
Eu não tô pensando na questão musical, mas
sim na questão que une a todos nós: Jesus! Pra que
eles (as grandes indústrias evangélicas) fiquem
envergonhados de ver as ovelhas fazendo a união pelo engrandecimento
do nome do Senhor!
Saiba
mais:
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Sobre
black gospel:
Livraria
Godspell- Rua 1o de Março, 08 – Centro (RJ)
Fone: (21)2509-4628
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